Prefiro pagar por tratamento contra HIV do que o salário de políticos
O presidente Jair Bolsonaro não cansa de produzir declarações constrangedoras. A bola da vez foi a reclamação dele sobre pessoas portadoras do vírus HIV. Para ele, essas pessoas são “uma despesa para todos no Brasil”. Tecnicamente o presidente não está errado. A Constituição prevê que saúde é um direito de todos os brasileiros e um dever do estado. Tanto é que o Sistema Único de Saúde (SUS) custeia tratamento e medicamentos para soropositivos. Ou seja, o Estado brasileiro paga por isso. Mas também paga por políticos como Bolsonaro.
Minha primeira reação ao ouvir o comentário do comandante da nação foi imaginar quanto custa um político no Brasil. Não precisa ser do quilate do presidente da República, pode ser um deputado do baixo clero (ops, o próprio Bolsonaro até 2017). A cifra para bancar um sem número de regalias é tão grande que não cabe numa simples contagem nos dedos. Isso, todavia, não é questionado no círculo político. Aliás, a maioria deles defende todas as vantagens concedidas ao longo de décadas para manter o caráter paternalista do Brasil. É um problema grave. E é bem maior do que o custo de alguém com HIV.
O comentário de Bolsonaro fica ainda pior no contexto em que aconteceu. O presidente criticava as críticas ao projeto de abstinência sexual para adolescentes proposto pela ministra Damares Alves. A iniciativa é uma tentativa de desestimular o início precoce da vida sexual e, com isso, diminuir a índice de jovens grávidas e de infecções sexualmente transmissíveis. Colocar um projeto como esse como política estatal é tentar coibir o livre arbítrio das pessoas. Escolher quando começar a ter relações sexuais é uma decisão privada. Cabe ao Estado orientar como. E só. Entretanto, não faltam fiscais da vida alheia, não é mesmo?
O presidente é tão fora da casinha que citou a própria filha, Laura, de 9 anos, como exemplo de público que a campanha tem como alvo. Dentro do ambiente em que está inserida, com os estímulos que ela tem, é provável que ela não se torne uma estatística de gravidez precoce, por exemplo. Não que isso haja uma garantia disso. Apenas é preciso identificar que Laura deve escolher o que fazer com a vida dela. Será que Bolsonaro teve a mesma preocupação com os filhos Flávio, Carlos, Eduardo e Jair Renan? Dificilmente, porém não ouvimos falar de um presidente avô precocemente até agora.
Como Bolsonaro praticamente colocou como uma “escolha” tratar ou não portadores de HIV, proponho outra troca. Ao invés de colocarmos essa “despesa para todos no Brasil” como um empecilho, podemos diminuir o alto custo para manter um sistema político que muitas vezes não ajuda quem realmente precisa. Acho que seria muito mais útil e bem menos preconceituoso.